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Bolsonaro falta a debate, mas protagoniza entrevista exclusiva em TV de aliados

Candidato do PSL falou à Record no mesmo horário do debate da Globo, manobra considerada irregular por adversários

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Bolsonaro teve 25 minutos para falar da campanha e atacar adversários; igreja e partido ligados à emissora declararam apoio a Bolsonaro
Bolsonaro teve 25 minutos para falar da campanha e atacar adversários; igreja e partido ligados à emissora declararam apoio a Bolsonaro - Foto: Reprodução de TV

A entrevista exclusiva do candidato de extrema direita Jair Bolsonaro (PSL), na TV Record, levantou questionamentos de outras chapas presidenciais. Com duração de mais de 25 minutos, ela foi ao ar na noite de quinta-feira (4), ao mesmo tempo em que os demais candidatos participavam de debate na TV Globo.

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Segundo a lei eleitoral número 9.504/97, "é vedado às emissoras de rádio e televisão, em sua programação normal e em seu noticiário, (...) dar tratamento privilegiado a candidato, partido ou coligação".

A regra de isonomia no tratamento das candidaturas está em vigor desde julho, quando foi encerrado o prazo para a realização das convenções. Porém, o capitão reformado do Exército pode contar com espaço privilegiado na emissora do bispo Edir Macedo, líder da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), que manifestou apoio à candidatura de Bolsonaro na semana passada.

Reportagem do jornal Folha de S.Paulo indica ainda que integrantes da campanha de Bolsonaro tentam articular acordo com a Record para que a emissora paulista desempenhe o papel de uma Fox News brasileira, em menção à emissora ultraconservadora estadunidense que apoia o presidente Donald Trump.

Na entrevista à Record, Bolsonaro teve oportunidade para falar de seu programa de governo e para atacar adversários sem ser contestado. As poucas interrupções da entrevista foram para o candidato tomar água, servida por um enfermeiro. A campanha argumentou que o candidato não foi ao debate por questões de saúde. A orientação médica era para que ele não falasse por mais de dez minutos e nem passasse por situações de tensão emocional.

A coligação Brasil Feliz de Novo, da candidatura de Fernando Haddad (PT), entrou com uma representação no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) para impedir a transmissão da entrevista irregular com o candidato do PSL.

O advogado Vitor Marques, coordenador do setorial jurídico do Partido dos Trabalhadores, destaca que o tratamento dado ao candidato de extrema-direita aconteceu no mesmo momento em que ocorria um debate democrático com os demais candidatos em outra emissora.

"Foi um nítido favorecimento ao candidato Jair Bolsonaro, na medida em que ele esteve à vontade, sozinho, para falar por um grande tempo e ter uma exposição no momento em que todos os outros candidatos foram submetidos a um debate onde eram questionados e havia um tempo determinado para se manifestar. Deste modo, houve uma violação 'chapada' ao artigo 45 da lei das eleições", disse advogado.

No entanto, o ministro Carlos Bastide Horbach, do TSE, nomeado pelo golpista Michel Temer (MDB) em agosto do ano passado, liberou a transmissão da entrevista exclusiva de Bolsonaro na Record. Para Horbach, barrar a entrevista do candidato seria "ato de censura prévia, contrária à liberdade de imprensa".

Recorrente

A participação de Bolsonaro em programas de rádio e TV, em entrevistas exclusivas, contrariando o artigo 45 da lei eleitoral, tem sido frequentes nas últimas semanas. 

Ainda internado no hospital, enquanto se recuperava da facada que recebeu em Juiz de Fora (MG), o candidato falou com a rádio Jovem Pan, no dia 24 de setembro. No dia da alta, 28 de setembro, falou por quase uma hora em um programa policialesco da TV Bandeirantes.

No dia 29 de setembro, mais uma entrevista para emissora de TV, desta vez a Rede Globo. No dia 4 de outubro, além da entrevista para a Record, Bolsonaro também falou para a rádio Jornal de Pernambuco. 

O advogado eleitoral Fernando Amaral destaca a irregularidade da exposição de Bolsonaro na mídia.

"É bom lembrar que rádio e TV são concessionárias de serviço e elas não podem fazer o que elas querem. Entrevistar o Bolsonaro sem ter entrevistado os outros candidatos, nas mesmas condições, no mesmo formato, com o mesmo tempo, é um tratamento privilegiado. Sobretudo a entrevista da Band na semana passada. A emissora poderia ter entrevistado os outros candidatos a partir da entrevista do Bolsonaro na sexta-feira e não fez. Tinha tempo hábil pra isso", disse.

Segundo o TSE, se houver um pedido de recurso no caso da Record, o processo será julgado por um colegiado de ministros. Se for comprovada a irregularidade, a emissora pode ficar 24 horas fora do ar.

Edição: Diego Sartorato