EXTREMA DIREITA

Saiba quem são e o que pensam os políticos da bancada bolsonarista

Impulsionados pela figura de Jair Bolsonaro, parlamentares eleitos defendem porte de arma e criminalização do MST

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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O PSL elegeu 52 deputados e se tornou a segunda maior bancada da Câmara dos Deputados
O PSL elegeu 52 deputados e se tornou a segunda maior bancada da Câmara dos Deputados - Montagem/Reprodução

A força da extrema direita que levou Jair Bolsonaro ao segundo turno das eleições presidenciais com 46% dos votos válidos também inundou o Congresso Nacional.

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O Partido Social Liberal (PSL), sigla do candidato, se tornou a segunda maior bancada da Câmara dos Deputados após o pleito de 7 de outubro. Apoiados na figura de Bolsonaro, 52 deputados da legenda foram eleitos. Em 2014, o PSL havia eleito apenas um parlamentar e, atualmente, possui oito.

Alavancado pela figura conservadora do pai, Eduardo Bolsonaro se tornou o deputado federal mais bem votado da história, reeleito com mais de 1,8 milhões de votos. Recentemente foi alvo de campanha na internet que mostrou um aumento de 432% do seu patrimônio desde 2014.

Durante voto favorável ao impeachment de Dilma Rousseff, Eduardo homenageou os militares de 1964 e dedicou seu voto a parcela da população que se posicionou contra o Estatuto do Desarmamento no plebiscito de 2005. Ao fim, o também policial federal fez um gesto de armas com as mãos após pedir a prisão de Lula e Dilma.

Em sua primeira gestão enquanto deputado federal, votou a favor da reforma trabalhista e da terceirização irrestrita, além de atuar intensamente a favor do projeto Escola Sem Partido.

Senado

A partir do ano que vem, Flávio Bolsonaro, irmão de Eduardo, ocupará uma cadeira no Senado, onde o PSL conquistou outras três vagas. Deputado pelo Rio de Janeiro desde 2003, Flávio também defende a ditadura militar brasileira, é a favor da pena de morte e da diminuição da maioridade penal. 

Recentemente o político defendeu os correligionários do partido que destruíram uma placa de rua que homenageava Marielle Franco, vereadora brutalmente assassinada no Rio de Janeiro em março deste ano. Para ele, os candidatos Daniel Silveira e Rodrigo Amorim "nada mais fizeram do que restaurar a ordem". Ambos foram eleitos pelo estado carioca. 

O Major Olímpio Gomes, um dos aliados mais próximos e antigos de Jair Bolsonaro, responsável pelas ideias do plano de governo do candidato para a segurança pública, também ocupa uma das vagas no Senado.

Alavancado pela onda de popularidade do presidenciável, o político é contra o estatuto do desarmamento, defende a extinção das torcidas organizadas e é favorável à redução da maioridade penal. O capitão reformado do exército já afirmou que também apoiará a venda de terras indígenas defendida por Bolsonaro. 

Ostentando o apoio de Bolsonaro, outras duas candidatas desconhecidas da política também se elegeram como senadoras. A juíza aposentada Selma Arruda, do Mato Grosso, foi eleita com 678.542 mil votos e defende o porte de arma para “o cidadão de bem”. 

Em entrevista anterior ao pleito, a candidata declarou que proprietários de fazendas e chácaras devem se defender, armados, contra ocupações de sem-terras. O argumento fomenta a violência de forma direta em um cenário já alarmante. Segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT), em 2017, 70 trabalhadores do campo foram executados, um aumento de 105% em comparação com 2013. 
 
A ex-juíza já afirmou que o Estado não deve intervir em questões como a desigualdade salarial entre homens e mulheres. A integrante do PSL é investigada por suspeita de abuso de poder econômico e foi alvo de pedido de cassação de sua candidatura pelo Ministério Público Eleitoral. 

Soraya Thronicke, do Mato Grosso do Sul, é outra candidata a senadora beneficiada pela onda bolsonarista. Assim como os demais da legenda, defende o porte de arma e minimizou a mobilização massiva de mulheres contra o conservadorismo de Bolsonaro no ato #EleNão, de 29 de setembro.  Segundo Thronicke, Bolsonaro não é machista. 

Câmara dos Deputados

Rachel Meneguello, professora do departamento de Ciência Política da Universidade de Campinas (Unicamp), avalia que os resultados das eleições 2018 produziram uma turbulência grave no sistema partidário brasileiro. 

Ela explica que, além do PSL ter se tornado a segunda maior bancada, partidos relevantes como PSDB e MDB perderam cadeiras. O Partido dos Trabalhadores (PT) elegeu 56 deputados, e se tornou o único partido que superou o PSL em votos.

"Não sabemos como esses candidatos eleitos atuarão, seja na Câmara, seja nas Assembleias, e não sabemos a força que os apelos que os elegeram farão eco nas deliberações mas no que se refere ao legislativo nacional e várias assembleias, entramos numa fase de conservadorismo que dará apoio institucional aos extremismos da direita”, afirma Meneguello. 

Para a cientista política, o conservadorismo que chegou ao Congresso Nacional já se constitui há algum tempo com maior força de mobilização por meio de grupos como o Movimento Brasil Livre (MBL) e outros que defendem o armamento, o preconceito, a censura, e demais bandeiras capitaneadas por Bolsonaro.

Em São Paulo, a eleição da jornalista Joice Hasselmann (PSL) como a deputada federal mais bem votada do Brasil, com mais de 1 milhão de votos, fortaleceu a bancada bolsonarista. Em entrevista a rádio Jovem Pan, a youtuber chegou a afirmar que seria “o Bolsonaro de cabelo loiro” e iria enfrentar os opositores do candidato. “Agora, a Maria do Rosário, o Jean Wyllys e a Gleisi Hoffmann são meus, vão se ver comigo”, disse. 

Reconhecida por seus posicionamentos críticos ao PT, ela protagonizou manifestações favoráveis a Operação Lava Jato e à Polícia Federal. Em 2016, escreveu uma biografia do juiz federal Sérgio Moro, intitulada “Sérgio Moro: a História do Homem por Trás da Operação que Mudou o Brasil.”

Hasselmann foi considerada racista por movimentos sociais ao ofender a senadora Regina Sousa ao chamá-la de “anta”, “semianalfabeta” e “uma criatura cretina”, enquanto a petista fazia defesa de Dilma no plenário. 

Em 2014, a jornalista, que já atuou na Veja, foi denunciada ao Conselho de Ética do Sindicato dos Jornalistas do Paraná (Sindijor-PR) por 65 plágios envolvendo 23 jornalistas. O sindicato comprovou a cópia dos conteúdos e impediu, definitivamente, o ingresso da jornalista no quadro da entidade.

O estado de São Paulo também elegeu Alexandre Frota pelo PSL, defensor radical do projeto Escola Sem Partido, com mais de 155 mil votos. Envolvido em diversas polêmicas e protagonista de declarações conservadoras, foi figura constante nas manifestações pelo impeachment de Dilma. 

Em setembro, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Distrito Federal condenou o ator a pagar multa de R$ 5 mil por ter publicado informações falsas a respeito do deputado distrital Chico Leite (Rede), que se candidatou ao Senado.

Ele já foi investigado por apologia ao estupro e atualmente está sendo processado por seu filho, Mayã Frota, de 18 anos, por uma alta dívida por pensão alimentícia. A dívida, segundo o jornal Extra, estaria em torno de R$ 60 mil. Em vídeo, Bolsonaro já expressou o desejo de ter Frota na pasta de cultura do seu governo, caso seja eleito.

Já Janaína Paschoal, com mais de dois milhões de votos, foi eleita para o legislativo estadual por São Paulo e quebrou um recorde histórico de votos, ultrapassando até mesmo Eduardo Bolsonaro. Autora do processo de impeachment contra a presidente Dilma, Paschoal foi cotada para ser vice de Bolsonaro e o acompanhou em entrevistas.

“O voto do estado de São Paulo é conservador, nos últimos 20 anos os partidos de centro e centro-direita ocuparam espaços importantes. O destaque de 2018 é a eleição de candidatos sem qualquer vinculação com partidos, sem propostas consolidadas, que conseguiram transformar a onda de movimentação iniciada em 2013 e a onda do impeachment em votos”, explica Rachel Meneguello, que coordenou o projeto “Radiografia voto dos paulistas”, responsável pelo mapeamento dos padrões de votação no estado de São Paulo pelo período de 20 anos (1994-2014).  

A especialista comenta que o avanço da direita e da extrema direita na política institucional também tem atingido outros países, no entanto, tal reação das populações à falta de respostas eficazes dos governos podem trazer consequências graves à sociedade. 

“É isso que ocorre no caso brasileiro. A democracia, a tolerância, o pluralismo, os direitos, estão em risco. A preocupação agora é saber como nossas instituições darão conta de defendê-los”.

Por todo Brasil

Referindo-se a Bolsonaro como “nosso comandante”, Marcelo Alvaro Antonio, deputado federal mais votado pelos mineiros, admitiu que conseguiu o feito pelo apoio do presidenciável. No Distrito Federal, Bia Kicis (PRP) também foi eleita  apresentando-se como a “Federal do Bolsonaro”. 

A avalanche de candidatos bolsonaristas também chegou ao nordeste. Impulsionado por Bolsonaro, Luciano Bivar foi eleito deputado federal em Pernambuco e atua nos bastidores da campanha do presidenciável. Fundador do PSL, empresário e ex-presidente do Sport Recife, Bivar é liberal e, para a economia, defende medidas como o imposto único, que prejudicaria os mais pobres do país.

“Braço direito” de Bolsonaro na Paraíba, Julian Lemos também tem uma cadeira garantida na Câmara. Apoiado no discurso antipetista e em defesa da polícia, já foi alvo da Lei Maria da Penha três vezes, acusado de agressão pela irmã e pela ex-esposa. Os casos ocorreram em 2013 e 2016. Em um deles, de acordo com reportagem da Folha de São Paulo, Lemos foi preso em flagrante.

No sul do país, Caroline de Toni é uma das representantes do PSL. Já foi presidente do MBL em Santa Catarina, além de ter participado da fundação do Movimento Liberal Conservador. Entre as propostas que a levaram a ser eleita deputada federal, estão a criminalização do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e o fim da demarcação de novas terras indígenas..

Mandar os médicos cubanos embora e valorizar os médicos brasileiros” e “abolir o financiamento público de jornais, emissoras, paradas gays, carnaval, etc”, são outras duas propostas da nova deputada federal. 

Fábio Wanderley Reis, cientista político e doutor pela Universidade Harvard (EUA),  critica a eleição de candidatos no legislativo apenas por terem se vinculado à imagem de Bolsonaro.

"Claramente há uma onda muito preocupante que está associada com o Bolsonaro, com as ideias ou com a falta de ideias, com a pobreza pessoal e intelectual dele. Com a truculência. Algo que pode ser diagnosticado, sem o abuso da palavra, como fascismo. Estamos vivendo uma onda fascista. Já estamos cheio de notícias sobre violência pelo país afora, sem sequer que ele tenha chegado propriamente a ganhar a eleição", alerta o professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). 

Aliados e coligações

Para além dos parlamentares eleitos do PSL, outros políticos de legendas aliadas também se apoiaram na figura de Bolsonaro para se elegerem.  A “surpresa” Wilson Witzel (PSC), que foi ao segundo turno no governo do Rio de Janeiro como o mais votado, com 41,2% dos votos, é um deles.

Onyx Lorenzoni (DEM), um de seus coordenadores de campanha do Bolsonaro, foi reeleito para seu quinto mandato como deputado federal com sua melhor votação. Ele é cotado para comandar a Casa Civil do candidato do PSL e já foi investigado por caixa 2 na campanha eleitoral de 2006. O conteúdo programático de Lorenzoni anda de mãos dadas com o candidato do PSL, baseado no discurso anticorrupção e contra o crime organizado.

Já em 2016, enquanto relator da comissão especial da Câmara que analisou medidas de combate à corrupção, Lorenzoni propôs reduzir as penas a serem aplicadas a quem praticar o crime de caixa 2. 

Apesar de não ser do PSL, Kim Kataguiri, cofundador do Movimento Brasil Livre  (MBL), declarou que irá votar 17 no segundo turno. Eleito deputado federal com mais de 400 mil votos, Kataguiri foi o quarto candidato mais bem votado em SP com uma agenda muito afinada aos demais "afilhados políticos" de Bolsonaro. 

O MBL é conhecido por espalhar fake news nas redes sociais e já foi condenado pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE) da Bahia por publicar uma notícia falsa relacionada a Jaques Wagner (PT). Em julho, o Facebook derrubou páginas e perfis ligados ao MBL por serem contas falsas e, segundo a empresa, “gerar divisão e espalhar desinformação”. 

Outro caso é do Sargento Fahur, da Polícia Militar Rodoviária do Paraná, também o mais votado do estado para a Câmara. Apesar de ser filiado ao Partido Social Democrático, é seguidor fiel do candidato do PSL e propagador de suas pautas reacionárias. O discurso de ódio é latente nos posicionamentos de Fahur. Em sua páginas na rede sociais, o político já publicou foto armado com a legenda “vagabundo é cacete no lombo e bala no rabo”.

Na avaliação de Fábio Wanderley Reis, a defesa do porte de armas, pauta comum a todos os candidatos do PSL, aprofundará a violência em um país recordista em homicídios. Ele reforça que os episódios de intolerância por motivação política aumentam exponencialmente na última semana. 

Mapeamento realizado pela Agência Pública em parceria com a Open Knowledge Brasil, revelou que 70 ataques ocorreram nos últimos 10 dias no país devido ao tensionamento do segundo turno eleitoral. Os eleitores de Bolsonaros são responsáveis por 50 desses ataques.

“Se as pessoas já estão mobilizadas desse jeito, o que acontecerá quando tivermos um presidente com a inconsistência pessoal, intelectual e ideológica do Bolsonaro e com a truculência óbvia que ele repetidamente manifesta, exercendo efetivamente a presidência da República?”, questiona o cientista político. 

Artes: Wilcker Morais

Edição: Pedro Ribeiro Nogueira